Remada a reboque

Por Sylvio Mancusi

Em um dia de ondas grandes a arrebentação de Maresias exige o uso de jet-ski. Foto: Renato Castanho.
Tow-in em Maresias. A circulação desenfreada de jet-skis no outside tem atraído a atenção de todos os que freqüentam uma das mais badaladas praias do litoral paulista, e dona de uma das melhores ondas do Brasil.

 

A modalidade começou a ser praticada por tarimbados surfistas de ondas grandes no Hawaii, Califórnia e Tahiti para facilitar a entrada em ondas que seriam impossíveis de serem surfadas na remada.

No Brasil são atípicos os mares em que é necessária a ajuda de um jet-ski, mas a praia de Maresias possui uma das arrebentações mais difíceis de varar em dias de ressaca.

O local de Maresias Flávio Caixa D´água concorda que o tow-in deve ser feito somente em ondas acima de 2,5 metros. Foto: Anselmo Cachorrão.

Por isso, os big riders utilizam a tecnologia para chegar ao outside com mais facilidade e treinar para a temporada de ondas grandes no exterior.

O problema é que atualmente o tow-in é praticado em qualquer condição de mar em Maresias.

O número de adeptos sem tarimba para a modalidade cresceu muito, na mesma proporção das reclamações, principalmente na forma de e-mails que chegam na redação do Waves.Terra com freqüência nos últimos meses.

Vários internautas, como o paulista Daniel Pascalicio que mora em Paúba, relatam a prática do surf a reboque marginalizado em dias de ondas pequenas e médias, colocando em perigo a vida de surfistas de remada e banhistas.

“Este veículo precisa iniciar uma campanha pela regulamentação do tow-in no Brasil. Está na hora de discutirmos as regras de um esporte que está ficando perigoso. Hoje em Maresias havia altas ondas de 1 a 1,5 metros e quatro jet-skis atrapalhavam e ameaçavam quem estava surfando no braço. Eu surfava uma vala com mais um amigo (a arrebentação estava tranqüila) e os caras dominavam grande parte da praia. Chegou ao cúmulo de um cara praticamente me contornar e pegar uma da série que eu esperava tranqüilamente. Pior, o jet veio na minha direção e quase fui atropelado em plena segunda-feira de ondas boas. É hora de um basta”, escreveu indignado Pascalicio.

Diante desse cenário, o vereador Wagner Teixeira, presidente da Câmara de São Sebastião, surfista e figura carismática na região, já redigiu um projeto de lei semelhante ao que foi aprovado no Estado do Hawaii, nos EUA.

“O município pode vetar a entrada de jet-skis nas praias. Estou fazendo um projeto de lei para ser votado pela Câmara do tipo que regularizou a modalidade no Hawaii. O tow-in só poderá ser praticado de acordo com a lei em dias de ressaca em que as ondas ultrapassarem os 2,5 metros e não existirem condições dos outros surfistas passarem a arrebentação na remada. Colocaremos algum oficial para a fiscalização ou conversaremos com os próprios bombeiros para que eles mesmos fiscalizem e apliquem as penalidades necessárias”, revela Teixeira.

O comandante Jauar, do Corpo de Bombeiros de São Sebastião, prometeu atuar com mais rigor na questão. “Temos 41 oficiais para cobrir 44 cidades, sendo que cerca de oito trabalham na delegacia. Quando recebemos o chamado vamos até o local, mas infelizmente as embarcações são rápidas e vão embora. Temos uma carreta vazia para dois jet-skis somente para a apreensão nesses casos. De agora em diante vamos fiscalizar Maresias rigorosamente, principalmente em dias de ondas pequenas”, declara.

Remada a reboque

Um dos pioneiros do tow-in no Brasil, Alemão de Maresias defende uma nova postura no esporte. Foto: Daniel Smorigo / Freesurfer.com.br.
Usar o jet-ski mesmo em ondas pequenas é uma forma divertida de realizar manobras radicais e, até o ano passado, surfistas experientes praticavam o surf a reboque em diversas condições de mar.

Mas chegou-se ao consenso que a prática incentivou e chamou a atenção de surfistas que não tem condições físicas e nem habilidade para surfar na remada.

O tow-in se encaixa perfeitamente para essas pessoas, afinal eles usam o jet para levá-los ao fundo e rebocá-los nas ondas, tornando o outside de Maresias um “water world” (filme em que foram usados diversos jet-skis).

Danilo Couto totalmente dentro da lei em Mavericks, Califórnia, onde o tow-in só pode ser praticado em ondas acima de 20 pés. Foto: Curt Myers.
Dentro desse paradigma temos duas opiniões de peso. Uma do veterano surfista e médico paulista radicado em Maresias Alfredo Bahia, e outra do surfista local Alemão de Maresias.

“A arrebentação em Maresias é uma das mais pesadas do Brasil. Quando as ondas ficam com mais de 2 metros eu defendo o uso do tow-in em uma área delimitada entre o Bar do Meio e o condomínio conhecido como 2000. Dessa forma, a coisa ficaria organizada. As melhores ondas para remada rolam mesmo mais para o Canto do Moreira. As ondas no local citado para o tow fecham muito rápido nos dias grandes e são propícias para o tow-in. Mas existem pessoas que presenciam toda essa situação e, mesmo vendo ondas lindas mais para o canto, fazem questão de surfar na remada no meio dos jets”, argumenta Bahia.

O também local Alemão de Maresias acrescenta: “Mesmo nos dias grandes não vai ser fácil lidar com essa galera inexperiente em Maresias. Eles não têm experiência nem na pilotagem do jet e nem no surf. Eu aproveito a ocasião para pedir desculpas por ter feito tow-in em ondas abaixo dos 2,5 metros, mas agora é hora de conscientização”, desabafa.

O local Flavio “Caixa D’água” Tavares concorda. “Eu pratico tow-in quando as ondas estão acima dos 2 metros. A arrebentação em Maresias é muito difícil e nesses dias não há ninguém na remada. Na última semana, com ondas de perfeitas de 1,5 metro eu surfei na remada. Enquanto esperava uma onda veio uma dupla na minha direção com dois péssimos surfistas e quase fui atropelado. Saí da água e disse que iria denunciá-los à Marinha. Mas essa rapaziada não está preocupada, afinal são pessoas abastadas e normalmente influentes”, explica o surfista que nasceu e surfa em Maresias há 25 anos.

O problema é mundial. Na Califórnia a mesma situação ocorre com os locais que surfam Mavericks e treinam na praia de Mosleine, fundo de areia muito parecido com Maresias. Apesar de a praia ser menos freqüentada do que Maresias, as queixas foram muitas e os atletas chegaram ao consenso que o tow-in só será praticado em locais onde não há ninguém remando e somente em dias de ondas grandes.

Em Mavericks, famoso pico de ondas grandes, a remada é praticada até os 20 pés, acima disso rola o tow-in. Mesmo assim alguns surfistas decidiram entrar com um processo tentando impedir o uso de jet-skis, pois Mavericks está situado em área de preservação ambiental. Na Califórnia foi proibido até o uso e a fabricação dos jets-kis com motor dois tempos.

Alguns experientes surfistas defendem a legalização de uma forma em que somente surfistas habilitados possam praticar o tow-in. Somado a lei que o vereador Wagner Teixeira pretende aprovar na Câmara, a prática ilícita e perigosa do tow-in em Maresias deve ser regularizada.

Tow-in, só para atletas habilitados, experientes e em ondas acima dos 2,5 metros e, é lógico, sem ninguém na remada. Essa é a minha opinião. O surf a reboque foi criado com esse intuito.

Aloha