SONHO ou PESADELO no MAR?

Dr David Szpilman

 

Era um lindo dia de verão, o sol brilhava, o terral aquecia a temperatura ambiente com seu bafo quente, e as ondulações entravam perfeitas com 1 metro e meio e regularmente “bombavam” como um coração cheio de vida. O local era a praia da Macumba no Recreio dos Bandeirantes – RJ, bem no meio, pertinho da pedra da Dona Maria e em frente aquele condomínio de sonhos chamado “La Plage”. Não havia muito “crowd” no local, embora fosse Domingo, e dava para surfar com certa tranqüilidade escolhendo as melhores. E lá estava Daniel com sua longboard curtindo sua licença especial como guarda-vidas. Daniel é um guarda-vidas simples, meio calado, extremamente profissional que ama sua profissão com a paixão dos antigos salva-vidas. O que se segue é a história deste dia contada pelo próprio e por pessoas presentes no local: “Eu estava sentado na minha prancha esperando a próxima rainha, quando vi o maior movimento de pessoas na areia gritando. Não dava para ouvir exatamente o que era. Olhei a pedra da Dona Maria e avistei um surfista perto que parecia precisar de ajuda, remei rápido achando que havia acontecido alguma coisa com ele mas me deparei, com espanto, com um menino emborcado, no meio da arrebentação. Saltei da prancha e o agarrei virando sua face para cima. Não havia nenhum movimento ou reação, sua pele estava fria e apenas uma grande quantidade de espuma saía vagarosamente por sua boca e nariz. Estava morto eu pensei, tenho que começar a fazer o boca-a-boca aqui dentro da água”. O pai do menino em desespero gritava da areia, salve o meu filho, salve o Thiago. Mas não dava para o Daniel ouvi-lo pois neste momento uma onda de 1,5m arrebentou em cima dos dois enquanto Daniel fazia sua terceira ventilação boca-a-boca. Foi prancha para um lado e Daniel agarrado com o Thiago para outro. Pessoas da areia tinham dificuldade para identificar o que Daniel tentava fazer dentro da água e porque não colocava o menino logo na prancha e partia para a areia. Daniel se refez, puxou a prancha pelo leash, subiu e puxou novamente o menino para cima e fez mais 4 ventilações. O menino então tossiu algumas vezes e Daniel pensou “está vivo graças a Deus”, colocou o Thiago em cima da prancha e partiu para a areia. No meio do caminho teve ainda que parar mais uma vez pois Thiago havia parado de respirar novamente e necessitou mais algumas ventilações artificiais para que ao chegar na areia estivesse chamando por seu pai, que ao seu lado chorava de felicidade em ver seu filho vivo. Thiago havia aspirado muita água e com a chegada do helicóptero aeromédico, o Dr Edson colocou-o em ventilação artificial com aparelhos e o levou ao CTI pediátrico do Hospital Miguel Couto. Sua aventura estava apenas no meio, mas já havia passado o pior pedaço. Sua evolução no CTI foi extremamente grave com infecção generalizada e chegou novamente a beira da morte, para após 15 dias se recuperar, obter alta e retornar ao seu lar. Sua alegria durante a internação era contagiante e sua força de vontade era a energia necessária para vencer os obstáculos. A frase que emocionou a todos foi “quando eu ficar bom vou treinar para ser salva-vidas”. É verdade que Thiago e Daniel não se encontraram olho no olho em hora nenhuma apesar do guarda-vidas ter ido por duas vezes visitá-lo no hospital. Este encontro será marcado para as próximas semanas e depois eu conto a vocês como foi toda a emoção deste encontro. Bom surfe e esteja sempre preparado para ajudar, a recompensa é a maior de todas, a vida! Valeu Anjo Daniel, obrigado por nos trazer o Thiago!