TETRAPLEGIA – UMA TRAGÉDIA QUE PODE SER EVITADA!
por Dr David Szpilman


Quando garoto, surfava todos os dias no Arpoador. Lembro-me que no dia de “crowd” tinha umas 20 pessoas, e nem todos tinham pranchas de fibra. Alguns surfavam de peito, madeirite ou prancha de isopor. Quando a onda não rolava, tinha outros tipos de distração. Um deles era mergulhar do “trampolim”, uma pedra lateral, bem no coração do Arpoador, que dava em uma piscina de 1 a 2 metros de profundidade dependendo da maré (sei que havia um nome do local, mas não me lembro).

 

Aproveitávamos quando a onda vinha e elevava o nível da piscina e nos atirávamos de cabeça. Não era muito alto, mas lembro-me de ter me ralado algumas vezes no marisco. Eu tinha apenas 12 anos, foi em 1970, aconteceu um episódio que a todos impressionou, e ficou marcado em minha memória. Estávamos surfando quando rolou o maior tumulto no local. Era um garoto “não local” que havia mergulho e batido com a cabeça no fundo de mariscos. Estava acordado e perguntava “porque não conseguia se mexer?” Na época só ficamos sabendo que o rapaz provavelmente jamais mexeria os braços e as pernas outra vez. Embora houvesse o “zum zum zum” de que só aconteceu porque era um “Haole”, todos nos colocamos em seu lugar, e apesar do “feeling” de sermos super-homens, o trampolim ficou bem vazio por um tempo. Anos mais tarde (muitos anos na verdade...), já trabalhando no Hospital Miguel Couto como médico, é que vim a atender vários casos de mergulho em água rasa com o conseqüente Traumatismo Raqui-Medular (TRM). Naquele momento foi quando a consciência bateu perfeitamente e aquela sensação de invulnerabilidade passa a realidade de seres humanos vencíveis e frágeis que imagina quanto desespero passa pela cabeça destas pessoas ao “sentir que nunca mais sentirá parte de seu corpo” e aí deve rolar aquela vontade de morrer...
 

TRM é o trauma da coluna e da medula podendo desligar totalmente as conexões de mensagens do cérebro para os membros. É claro que a coluna cervical é a mais vulnerável e também a mais grave, e se quando ocorre, fica tudo paralisado do pescoço para baixo.
 

Pois é, esta e outras histórias de TRM (a do Super Homem, por exemplo) fazem a gente pensar que MERGULHO EM ÁGUA RASA É SUICÍDIO. Tem gente pulando de ponte, de pedras, e de outros locais, onde o desafio da morte pode não ficar só no desafio.
 

Quando devemos pensar em TRM - Afogamento em local raso; vítima com trauma (acidente de barco, aeroplanos, prancha, moto-aquática e outros); Mergulhos de altura na água (trampolim, cachoeira, pier, pontes e outros); Mergulho em água rasa (cambalhotas na beira da água); Surf de prancha ou de peito; Queda em pé (desembarque de barco em água escura); Esportes radicais na água; Iatismo (trauma com o mastro); Brigas ou brincadeiras violentas dentro da água.
 

O que fazer ?
1. Exame primário - ABC da vida – Certifique-se que a vítima esta respirando.
2. Em caso de parada respiratória – esqueça o TRM e faça a ventilação boca-a-boca.
3. Em caso de vítima viva - Imobilize a cabeça/pescoço em posição neutra com as mãos e/ou os braços - A proteção da coluna cervical deve ser prioridade se não houver parada respiratória. Improvise com a prancha de surf até o socorro médico chegar. A falta de cuidado nestes casos, pode determinar o agravamento da lesão.
Antes de se arriscar, pense no que pode perder!